90 propostas para reforçar as garantias dos contribuintes

Prazo-teto de 90 dias para executar sentenças, arbitragem mais rápida e custas mais baixas. Estas são algumas das propostas da comissão para reforçar garantias dos contribuintes.
Após nove meses de estudo e de trabalho, são conhecidas esta segunda-feira as propostas da comissão criada pelo Governo para tornar mais eficiente o procedimento tributário e reforçar as garantias dos contribuintes. Deste processo, durante o qual foram ouvidas mais de 100 personalidades ou instituições, o grupo de trabalho chegou a um conjunto de cerca de 90 propostas de alteração.
Ainda assim, esta não é uma reforma fiscal, e é a própria comissão quem o diz, na apresentação das conclusões que serão tornadas públicas esta segunda-feira, na conferência “O Futuro do Contencioso Tributário”. “As alterações ora sugeridas às garantias dos contribuintes e à legislação de procedimento e de processo tributário não consubstanciam uma reforma do sistema, mas apenas a introdução de um conjunto de medidas circunscritas e diretas que têm como objetivo conferir ganhos de eficiência, qualidade e de fiabilidade ao contencioso tributário”, pode ler-se na apresentação, a que o ECO teve acesso.
O trabalho da comissão presidida por Rogério Fernandes Ferreira — advogado, especialista em fiscalidade e antigo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais no último Governo de António Guterres — foi propor mexidas específicas dentro do edifício legal existente, com a seguinte filosofia:
a) “não promover, como regra, modificações estruturais no contencioso tributário vigente;
b) alterações pontuais e circunstanciais para maior eficácia;
c) simplificação da legislação procedimental e processual;
d) regras mais facilmente percetíveis pelos operadores jurídicos”.
A comissão avança cerca de 90 propostas, divididas por 14 subáreas, desde a execução fiscal ao regime jurídico da arbitragem tributária, passando pela execução de julgados ou o regime geral das infrações tributárias. Entre as propostas estão algumas mexidas nos prazos, novidades na publicidade dos processos ou as notificações por telefone ou email. É ainda avançada a proposta de criação de um novo procedimento de resolução de litígios fiscais internacionais e a redução das custas processuais,
A comissão foi composta por 12 pessoas: para além do presidente, Fernandes Ferreira, cinco membros da magistratura e seis especialistas. Veja as dez propostas mais relevantes no contencioso fiscal.
1) Execução de sentenças em 90 dias
O que é proposto: a Administração Tributária (AT) passa a ter 90 dias para executar as decisões judiciais, podendo a execução avançar antes do trânsito em julgado quando o recurso tenha apenas efeito devolutivo. Prevê-se responsabilização por inexecução ilícita.
Qual é o objetivo? Recupera-se liquidez e encerra-se o contencioso; uma decisão sem execução atempada vale metade.
2) Transparência: publicação obrigatória das decisões dos TAF
O que é proposto: todas as sentenças dos tribunais administrativos e fiscais passam a ser publicadas (com anonimização) num repositório pesquisável, com metadados normalizados.
Qual é o objetivo? Previsibilidade e menor “ziguezague” interpretativo; advogados, empresas e AT passam a jogar com o mesmo mapa.
3) Litígios fiscais internacionais com capítulo próprio
O que é proposto: Regras claras de admissibilidade, tramitação e prazos; suspensão de caducidade/prescrição durante procedimentos amistosos; direito de audiência reforçado; indemnização por garantias indevidas.
Qual é o objetivo? Menos fricção em dupla tributação e preços de transferência; melhor sinal para investimento estrangeiro.
4) Menos labirinto: forma processual integrada (fiscal + administrativo)
O que é proposto: Criação de uma via única para impugnar atos tributários e atos administrativos em matéria fiscal, evitando duplicações e nulidades por “porta errada”.
Qual é o objetivo? Menos custos e atrasos processuais; mais foco no mérito.
5) Retenções na fonte: janela única de dois anos (conta dos 20 de janeiro)
O que é proposto: Prazo uniforme de 2 anos para corrigir retenções e reclamar, contado a partir de 20 de janeiro do ano seguinte, alinhado com as declarações de substituição.
Qual é o objetivo? Simplifica a vida a contribuintes e departamentos fiscais; reduz litigância por prazos difusos.
6) Arbitragem (RJAT) digital “a sério”
O que é proposto: Submissão 100% eletrónica, suporte editável, notificações digitais, dispensa de reunião inicial e prazos curtos (ex.: 10 dias para taxa subsequente e para responder a exceções).
Qual é o objetivo? Decisões mais rápidas e rastreáveis, com menos “passos mortos”.
7) Recursos na arbitragem com revista excecional
O que é proposto: Clarificação de competências e critérios territoriais; reforço de impedimentos/deveres de revelação; criação de revista excecional por oposição de julgados e admissão de revisão; prazo-meta de 4 meses e regras para férias judiciais.
Qual é o objetivo? Rapidez com válvula de segurança para corrigir erros graves, sem “judicializar” toda a arbitragem.
8) Execução fiscal proporcional: planos até 60 prestações
O que é proposto: Até 60 prestações (cinco anos) em casos especiais; critérios objetivos para avaliação de garantias; fim da citação provisória; notificação obrigatória da penhora; prazos e registos clarificados.
Qual é o objetivo?: Protege tesouraria de famílias e empresas sem premiar incumprimento doloso; reduz penhoras “a frio”.
9) Disciplina na impugnação (CPPT): foco no mérito
O que é proposto: Preclusão de repetição de meios após impugnação; conclusões obrigatórias; anexos mínimos (ato e lista de documentos); 60 dias para pronúncia do dirigente máximo; 30 dias para recursos sobre acesso a dados bancários.
Qual é o objetivo? Menos incidentes formais, mais decisões substantivas.
10) Custas mais baixas: fim da “fixação especial de valor”
O que é proposto: Eliminar a fixação especial de valor nas ações da Segurança Social e reduzir para metade a taxa de justiça em casos-tipo (com extensão por analogia a executivos CPTA sem providência de execução).
Qual é o objetivo? Baixa a barreira de acesso à justiça, sobretudo em litígios de baixo/médio valor (singulares e PME).
Fonte: Eco
Foto: Miguel Baltazar