Tribunal Constitucional declara inconstitucional lei da eutanásia

Tal como o DN antecipou, decisão foi anunciada esta terça-feira. Com três questões apontadas, "formou-se maiorias no sentido da inconstitucionalidade".

O Tribunal Constitucional (TC) divulgou esta terça-feira o veredicto sobre a lei da eutanásia, tal como o DN havia antecipado ontem. Os juízes do Palácio Ratton declararam inconstitucionais, com "força obrigatória geral" alguns dos trechos da legislação, nomeadamente três deles. Assim, "formaram-se maiorias no sentido da inconstitucionalidade", lê-se na nota enviada às redações.

O primeiro ponto declarado inconstitucional foram os "vários segmentos da lei" que pressupõem que o doente tem o direito a escolher entre os dois métodos de morte medicamente assistida – suicídio ou eutanásia −. No entanto, "na sua atual versão, a lei só consente a eutanásia se o doente estiver fisicamente impossibilitado de autoadministrar os fármacos letais".

Os juízes entenderam como "lapsos do legislador" que, "numa matéria extremamente sensível, podem criar dificuldades desnecessárias ao intérprete e geram um risco evitável de má aplicação do direito, ofendendo o princípio constitucional da segurança jurídica".

O segundo ponto é o da "norma que regula o modo de intervenção do médico especialista na patologia que afeta o doente, ao não exigir que este seja examinado, ao contrário das legislações estrangeiras que consagram regimes de eutanásia mais próximos do português".

São citadas, por exemplo, as leis da Bélgica, Luxemburgo e Espanha. "No entender do Tribunal, a omissão desta exigência comum põe em causa a idoneidade, objetividade, impassibilidade e confiabilidade do juízo médico de verificação das indicações clínicas da morte assistida, o que se traduz numa tutela deficitária da vida humana e na violação da reserva de lei parlamentar", explicam.

Por fim, o TC declarou inconstitucional "a norma que impõe ao profissional de saúde que recusa praticar ou ajudar o ato de morte medicamente assistida o ónus de especificar a natureza das razões que o motivam". A justificação dos juízes é de "a mesma constitui uma restrição desadequada, desnecessária e desproporcional da liberdade de consciência, na vertente negativa da liberdade de não manifestar a terceiros as convicções pessoais".

De acordo com o TC, as "demais normas cuja apreciação da constitucionalidade foi requerida – quase todas as que integram o diploma – não foram declaradas inconstitucionais". No entanto, por força da maioria, todo o diploma fica considerado sem efeito.

TC "reiterou e aprimorou jurisprudência"

Ao analisar o tema pela terceira vez, o TC diz que "reiterou e aprimorou a sua jurisprudência" sobre a matéria. O entendimento é de que "a Constituição não impõe nem proíbe categoricamente a legalização da morte assistida, confiando ao legislador uma margem de ponderação entre os valores da liberdade individual e da vida humana, nomeadamente em situações clínicas marcadas pela gravidade, irreversibilidade e sofrimento".

Para os juízes, "a morte assistida, como questão de princípio, é um problema de ordem política, cabendo ao legislador, no gozo da sua legitimidade democrática, arbitrar a tensão perene entre valores constitucionais de sentido contrário neste domínio de vida caracterizado pelo dissenso persistente e razoável entre os cidadãos". Esta terceira análise da matéria foi realizada na sequência de dois pedidos: de um grupo de 56 parlamentares do Partido Social Democrata (PSD) e da provedora de Justiça Maria Lúcia Amaral.

Tomadas de posição

Em setembro de 2024, mais de 250 pessoas de vários quadrantes políticos subscreveram uma carta em que solicitavam a regulamentação da lei. Dias depois, outro grupo criou um manifesto para revogar essa mesma lei. A ministra da Saúde, Ana Paula Martins, afirmou na altura que o Governo estava à espera da decisão do TC sobre a matéria.

Com a queda do Governo, o tema ficou para decisão do próximo Executivo, como disse o próprio presidente Marcelo Rebelo de Sousa no mês passado. “Se o tribunal entender que não há razões para se pronunciar pela inconstitucionalidade, então vale a lei que está promulgada e está em vigor. O problema seguinte é saber quando, como, em que circunstâncias quem vencer as eleições, ou a maioria que existir, mas provavelmente aí é o Governo, regulamentará essa lei”, disse o presidente.

O tema tem passado fora dos radares desta campanha eleitoral, não sendo mencionado nos debates em curso nas televisões. Publicamente, é sabido há divergência sobre a matéria entre o CDS-PP e o PSD.

Fonte: Diário de Notícias
Foto: DR