Câmaras em risco de ilegalidade por cancelamentos no Alojamento Local
A entrega de prova de atividade dos Alojamentos Locais que são habitação própria permanente não é obrigatória mas municípios não têm como fazer verificação, denuncia a ALEP.
Os municípios podem estar em risco de cometer uma ilegalidade se cancelarem os registos de Alojamento Local (AL) relativos à habitação própria permanente (HPP) que não tenham entregado o comprovativo de atividade até ontem. O alerta é dado pela Associação do Alojamento de Portugal (ALEP) que explica as câmaras municipais não têm forma de confirmar a natureza dos registos que não foram submetidos.
Os proprietários de AL do país tinham de fazer prova, até esta quarta-feira, 13, da sua atividade. De acordo com a Lei n.º 56/2023, de 06 de outubro, no âmbito do programa Mais Habitação, os titulares do registo de AL são "obrigados a efetuar prova, mediante apresentação de declaração contributiva, da manutenção da atividade de exploração, comunicando efetividade de exercício na plataforma RNAL - Registo Nacional de Alojamento Local, através do Balcão Único Eletrónico".Caso não o fizessem, está previsto o cancelamento dos respetivos registos, por decisão do presidente da câmara municipal da respetiva região. A medida não é, contudo, aplicável à exploração de unidades de alojamento local em HPP, desde que essa exploração não ultrapasse 120 dias por ano.
O problema, levanta a ALEP, é que sem os respetivos comprovativos de atividade as câmaras não conseguem aferir se o alojamento é uma HPP ou, por exemplo, um registo fantasma. "As câmaras, com as quais temos contactado, dizem que podem estar a incorrer em situações de ilegalidade com a questão dos cancelamentos. Se não cancelarem os registos [que não entregaram prova] não estão a cumprir a lei mas se cancelarem um registo de HPP também. É complexo e as câmaras não sabem como agir", explica o vice-presidente da ALEP ao Dinheiro Vivo. Nuno Trigo adianta que a própria ALEP foi sensibilizando os proprietários para o envio dos comprovativos mas que "na lei nada obriga a isso". "Mas há muitos que podem ter optado por não o fazer e as câmaras municipais não podem cancelar sob pena de depois estarem a cometer uma ilegalidade e virem a ser chamados por esses titulares. Esta situação vai resultar em situações complicadas para os municípios e, inclusive, algumas em tribunal", lamenta.
O responsável adianta que alguns municípios solicitaram também proativamente junto dos proprietários o esclarecimento sobre o tipo de AL para evitar constrangimentos. Nuno Trigo acusa o governo de "fazer leis em cima do joelho" e atesta que há uma lacuna sobre como deverá ser realizada a validação dos comprovativos. Por isso mesmo, garante, os municípios não querem entrar numa onda de "cancelamentos cegos".
"Pela lei os proprietários têm de cancelar tudo. Mas existe bom senso e as câmaras municipais são as primeiras a estar preocupadas com a economia local, com os pequenos proprietários que impactam os pequenos comerciantes. Pelo bom senso, as câmaras dizem que não irão atuar de uma forma cega nos cancelamentos, até porque não têm capacidade de perceber o que é que é habitação própria permanente, mas pela lei teria de ser", indica.
Depois de o governo ter prorrogado por seis dias o prazo para a entrega da prova de exploração, a pedido da ALEP, e depois de terem sido registados constrangimentos na plataforma, a próxima fase é, para a associação, ainda incerta. "Uma coisa é a entrega da prova de atividade e outra coisa é a validação dessa prova. Neste momento, só estamos a falar da entrega e depois existirá um processo que vai demorar meses para as câmaras validarem essas provas. Não está claro na lei quais são obrigatórias e quais não são, não sei como vão gerir este nível", indica o porta-voz da ALEP.
Metade do AL em Lisboa pode ser cancelado
O prazo para a entrega de provas de atividade só terminou ontem às 23h59. Nem o Ministério da Economia nem a Agência para a Modernização Administrativa (AMA) adiantaram ao Dinheiro Vivo números. Fonte oficial da Secretaria de Estado Digitalização e da Modernização Administrativa avançou apenas que o sistema esteve "em pleno funcionamento e a registar um volume normal de submissões". A Câmara Municipal do Porto confirmou ter recebido 9203 declarações contributivas, dos 10 500 AL registados no RNAL.
Já em Lisboa, adianta a ALEP, "cerca de 50% dos AL não fizeram prova". Ou seja, apenas metade dos 20 mil registos de AL da capital é que submeteram os comprovativos. Parte podem ser registos inativos, admite a associação, as chamadas licenças fantasma. "Mas há uma série de outras situações, nomeadamente os estrangeiros que, por ser via eletrónica e ser preciso chave móvel digital, não tiveram capacidade de submeter. Há também as pessoas mais idosas que sendo este um processo digital tiveram muita dificuldade. E temos um grupo, que pode ser bastante significativo, que respeita aos registos de AL que são efetuados na HPP", refere Nuno Trigo.
Para o porta-voz da ALEP a situação "é muitíssimo preocupante a todos os níveis". "Se isto for taxativo quer dizer que 50% do AL em Lisboa teriam de ser obrigatoriamente cancelado. Mais de 40% das dormidas feitas em Lisboa são feitas em AL, mesmo retirando aqueles que já estariam inativos, haveria uma percentagem muito grande de alojamentos que ou fechavam ou estavam na ilegalidade. O nosso medo é que se esteja a promover uma ilegalidade não proativa por parte dos titulares, por incapacidade", adianta.
A ALEP teme que a medida "se transforme em algo negativo para todo o setor e um problema para as câmaras municipais".
Fonte: Diário de Notícias
Foto: Fábio Poço/Global Imagens