Norte-americanos apostam em vistos que permitem trabalhar em Portugal

Este ano, os EUA são a estrela dos vistos gold, tendo destronado a liderança dos chineses. Mas estes cidadãos estão a optar por outros regimes para se instalarem no país.

As estatísticas mostram que muitos norte-americanos chegaram a Portugal à boleia dos vistos gold, mas grande parte está a optar pelo D7, um visto que concede autorização de residência a pensionistas, titulares de rendimentos passivos e a cidadãos que pretendem trabalhar no país. Ora, neste contexto, o fim das ARI (Autorização de Residência para Atividade de Investimento, como são designados oficialmente os vistos dourados), hipótese colocada há dias pelo primeiro-ministro, António Costa, não fará grande mossa no investimento residencial norte-americano. Isso mesmo dizem as redes imobiliárias.

O visto D7 que "concede residência em Portugal mediante um comprovativo de rendimento passivo muito acessível para a realidade norte-americana, tem sido igualmente uma forte opção", avança Patrícia Clímaco, CEO da Castelhana. Ricardo Sousa, CEO da Century 21, sublinha mesmo que "a maioria dos clientes norte-americanos procuram o visto D7". E Patrícia Barão, responsável pelo departamento de residencial da JLL, defende que a maioria das compras americanas "é independente do regime de vistos gold".

Os dados da Confidencial Imobiliário (CI) relativos à aquisição de imóveis habitacionais na ARU de Lisboa confirmam essas afirmações. É que nos primeiros seis meses deste ano, os norte-americanos gastaram 48,3 milhões de euros a comprar casa na capital (as estatísticas excluem as zonas do Parque das Nações, Laranjeiras e Alta de Lisboa), período em que a cidade já não era elegível para obtenção de vistos gold. Recorde-se que as alterações ao regime, que excluíram a compra de imóveis no litoral, entraram em vigor a 1 de janeiro. Neste primeiro semestre, os americanos foram responsáveis por 90 operações, pesando 12% no total do investimento internacional efetuado nestes meses na metrópole. Para Ricardo Guimarães, diretor da CI, "não é pelos vistos gold que os americanos investem em Lisboa, por muito que possam beneficiar deste regime. A cidade afirmou-se no radar internacional, é um mercado muito atrativo pelas condições de vida e pelo preço do imobiliário".

Força do dólar
A Century 21 começou a sentir uma "intensificação de interesse por parte de clientes norte-americanos desde o final de 2020", sendo que este ano tornaram-se o cliente internacional n.º1 da rede, aponta Ricardo Sousa. Desde janeiro, das 2710 transações efetuadas pela Century 21 com compradores estrangeiros, mais de 400 foram com americanos, que optaram preferencialmente por apartamentos e moradias com áreas grandes em Lisboa, Norte e Algarve. Na JLL e na Castelhana, a realidade não é diferente. Segundo Patrícia Barão, "esta nacionalidade cresceu 65% face ao ano passado no que toca à procura por imóveis e ocupa neste momento o número 1, em paralelo com a brasileira". Este ano, a JLL já vendeu cerca de 150 casas a norte-americanos, desde apartamentos a moradias de milhões em Cascais, num valor global superior a cem milhões de euros.

As escolhas para viver têm recaído em Cascais, Lisboa, Porto, Comporta e Algarve. Patrícia Clímaco sublinha que os americanos são atualmente "a terceira nacionalidade que mais visita o website da Castelhana, depois dos portugueses e logo atrás dos brasileiros" e são, a par com o Brasil, "a principal nacionalidade estrangeira a adquirir imóveis em Portugal" na agência.
Até agora, a atratividade de Portugal estava centrada no estilo de vida, segurança, acessibilidade do sistema de saúde, valor dos seguros de saúde, o preço dos imóveis comparativamente com as principais cidades dos EUA, as infraestruturas de mobilidade e comunicação, descreve Ricardo Sousa. Mas surgiu um novo fenómeno com a guerra da Ucrânia e a crise energética que está a contribuir para o dinamismo do investimento americano. Como sublinham os três especialistas do setor imobiliário contactados pelo DN/Dinheiro Vivo, a paridade entre o euro e o dólar é a cereja no topo do bolo para os americanos. É, pois, de esperar que esta dinâmica, muito assente em cidadãos que vêm trabalhar ou desfrutar da reforma, se mantenha nos tempos mais próximos.
Investimento duplicou

Mas os vistos gold não perderam força. No espaço de três anos, o capital aplicado neste regime proveniente dos EUA quase duplicou. E a pandemia serviu de acelerador do interesse destes investidores. Desde 2020 e até setembro deste ano, despenderam 183,5 milhões de euros, 66% do total investido por esta nacionalidade desde o início do programa, em outubro de 2012. A atenção sobre o país terá também sido despertada porque Madonna viveu uns anos em Lisboa, seguindo os passos de John Malkovich, Monica Belluci e Christian Louboutin, ou mesmo porque correram rumores que George Clooney ia construir uma casa na Comporta. E o mediatismo da Web Summit e a instalação de dezenas de tecnológicas no país não terá sido alheio a esta apetência. Sejam quais forem as razões, é indiscutível que estão a eleger Portugal como destino para residir e Lisboa está no centro das atenções.

Nos primeiros nove meses deste ano, aplicaram 82,6 milhões de euros para obterem o visto gold, mais 31 milhões do que o montante gasto no total de 2021, exercício em que subiram ao segundo lugar do pódio das nacionalidades que mais requisitaram esta autorização de residência, mostram os dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF). O ano ainda não terminou, sendo expectável a atribuição de mais ARI até dezembro, e já se contabiliza um aumento de 90% face aos 43,5 milhões aplicados em 2019. Foi a partir desse ano que os norte-americanos começaram a figurar no top cinco das nacionalidades com mais vistos dourados, entrando diretamente para o quarto lugar, e, desde aí, têm escalado uma posição anualmente. Em 2022 e até setembro, os dados do SEF mostram que destronaram os chineses da liderança. Desde o início deste regime, o SEF contabiliza 277,5 milhões de investimento com origem nos EUA para a obtenção de 483 vistos gold, com a larga maioria deste volume, precisamente 213,8 milhões, a ser aplicado em imobiliário.

Fonte: Diário de Notícias
Foto: Gerardo Santos/Global Imagens